Tuesday, November 18, 2008

DEMOSCENE, DEMOPARTIES E A MÚSICA NA COMPUTAÇÃO

Escrevi este artigo que foi publicado na Revista A Rede, n. 42, novembro de 2008

A cibercultura reunificou dois campos que haviam sido completamente afastados pelo processo de divisão do trabalho e especialização capitalistas: a ciência e as artes. A digitalização intensiva dos últimos trinta anos permitiu que alguns grupos sociais que estavam a margem do sistema ganhassem força e iniciassem uma série de experiências de tecno-arte e de fusão da música com a programação computacional. O próprio espírito do hipertexto, das ligações e pontes entre trabalhos diferentes, incentivou as recombinações e fortaleceu a criação de plataformas colaborativas e de remixagens variadas.

Um dos exemplos mais característicos desse movimento é uma subcultura que reune a computação às artes digitais chamada demoscene. O objetivo da demoscene é a produção de sons e imagens a partir da programação computacional gráfica. A enciclopédia colaborativa Wikipedia esclarece que um demo visa "demonstrar capacidade e destreza técnicas em habilidades de programação, artes gráficas e música". Resumidamente podemos dizer que os demos são programas executáveis produzidos em tempo real, reunindo programação e música. Os demos que são similares aos vídeos de música e aos pequenos filmes de animações. Em geral, são desenvolvidos em Demoparties, eventos que reúnem diversos demomakers e demogroups que competem para criarem o melhor demo.

No universo cracker, os demos eram inseridas após a proteção anticópia serem removidas dos programas de computador. Evoluiram de telas de crack (que demonstram o feito no próprio programa violado) com um simples texto para telas com efeitos combinados de sons e animações visuais. Grupos de crackers que assinavam as mensagens introdutórias as suas façanhas passaram a chamá-las de "letter" e depois de "demo". Provavelmente essa é a origem do termo.

Segundo a associação alemã Digitale Kultur (cultura Digital), que busca apoiar as atividades das demosecenes na Alemanha, Demo Parties têm ocorrido principalmente na Europa, em países como Finlândia, Holanda, França, Suécia e Alemanha. Já ocorreram algumas Demo Parties nos Estados Unidos, em Berkeley, San Diego, e também no Canadá. Uma demoparty acontece, em geral, durante três dias, em geral, nos finais de semana, em locais amplos como ginásios e auditórios. Os participantes trazem seus computadores e aparelhos de som. Sem parar um único minuto a música Loud vibra em todo o ambiente, enquanto as equipes de demomakers programam seus demos. Os trabalhos são exibidos, em geral à noite, em um telão a partir de um projetor e de gigantescas caixas de som.

As demoparties surgiram nos anos de 1980, antes da web ser criada e se expandir pelo planeta. As copyparties, eventos de compartilhamento de softwares e games, estão na origem das demoparties. Em algumas dessas reuniões, programadores, hackers demonstravam seu talento transformando as rotinas e algoritmos de determinados programas computacionais em música eletrônica. O grande lance era tirar musicas e efeitos visuais de computadores da família Apple II, Commodore 64, Atari, Amiga e PCs, entre outros. Ainda segundo a Wikipedia, "os grupos neerlandeses 1001 Crew e The Judges, ambos para Commodore 64, são mencionados como os primeiros demogroups. Competindo entre si durante o ano de 1986, criaram demos com músicas e gráficos originais, se aproveitando das capacidades técnicas do computador. Simultaneamente, outros grupos e indivíduos como Antony Crowther (Ratt) passaram a distribuir suas obras por redes como a Compunet do Reino Unido". (http://pt.wikipedia.org/wiki/Demoscene)

Existem vários repositórios de demos. Alguns deles permitem downloads de trabalhos considerados os melhores de uma série de demoparties. Na scene.org (http://www.scene.org/tips.php) é possível acessar inúmeros trabalhos que permitem observar como foi a evolução da demoscene desde 1995. Os mais recentes podem ser baixados pela rede. A ADAN (Association for Digital Arts Development) é uma associação européia, sem fins lucrativos, que mantém um stream de demos para todos os criadores de demoscene chamado de Demoscene TV (http://www.demoscene.tv/). Outra importante midia da comunidade demoscene foi a Rádio Nectarine (http://nectarine.ojuice.net/), que existiu até setembro de 2008, quando foi vítima de ataque devastador nos servidores que a hospedavam. Era uma verdadeira estação demoscene. Nectarine reproduzia músicas demo obtidas de todos os trackers da comunidade e também recebia pedidos de músicas de seus ouvintes.

A comunidade de demoscene é extremamente criativa. Sua característica mais marcante é a capacidade de unir a complexidade técnica das ciências exatas com a sensibilidade artística e o bom gosto estético. Segundo a Demoscene TV, o "espírito de equipe, a mente aberta, a criatividade e o talento permanecem sendo as palavras-chave para definir a atividade demoscene". Vincent Scheib escreveu que os demos "estão prestes a fazer de um computador a coisa mais legal que já se tenha visto, pois eles estão prestes a portar a grande música, a grande arte e a grande programação". Esta é a essência da cibercultura que hoje tem na subcultura demiscene uma das suas mais importantes manifestações.

PARA IR MAIS LONGE:

Um dos textos mais claros e descritivos da história e das tendências atuais da demoscene é Introduction to the Demoscene - hugi (somene em inglês) que pode ser acessado no site:

1 comment:

Victor Nunes Toscano said...

Professor Sérgio,

Sou estudante de economia da Universidade Federal do Espírito Santo e estou fazendo minha monografia sobre o software livre (em específico sobre o GNU/Linux) e as economias de Rede. Pesquisando na internet eu encontrei um artigo seu de 2002, que me inspirou bastante. Gostaria muito de trocar informações e as experiências que vivenciei durante esse ultimo ano de pesquisa. Estou deixando meu e-mail para que possamos nos comunicar, ok?

victornunestoscano@gmail.com

Um Abração

Victor



Ps.:Estou me comunicando pelo seu Blog, pois não encontrei seu e-mail disponível, me desculpe se fui de certa forma intrometido, não era essa a intenção.