Existem diversos modelos de desenvolvimento e uso de software, mas dois deles são claramente opostos em seus objetivos e métodos. O modelo proprietário tem como procedimento inerente negar o acesso ao conhecimento contido no software, por isso baseia-se no código-fonte fechado e no desenvolvimento não-compartilhado. Já o modelo de software livre busca transferir continuamente o conhecimento essencial presente no software. Para isso, é necessário a abertura do seu código-fonte, o que viabiliza o desenvolvimento colaborativo das soluções.
A visão sobre a criação e a difusão do conhecimento tecnológico é a questão central que diferencia os dois modelos. Os defensores do modelo proprietário pregam que a base da criatividade é a propriedade. Sem ela, não haveria incentivos suficientes para a contínua produção de novidades. A humanidade só teria interesse em criar se puder retirar das suas criações o máximo benefício econômico. Os defensores do software livre defendem que a liberdade e o compartilhamento do conhecimento é a base da criatividade. Observam a história da ciência e notam que seu gigantesco avanço foi resultado de uma série de fatores, mas certamente o acúmulo contínuo do conhecimento e troca livre de saberes foram elementos fundamentais que determinaram o ritmo da evolução científica.
O fato é que existe atualmente uma mobilização colaborativa planetária, ou seja, em praticamente todos os países existe a comunidade de software livre. Este movimento é crescente e capaz de realizações tecnológicas extremamente poderosas, tal como o software Apache que está sendo utilizado por aproximadamente 70% dos servidores de páginas web no mundo. Um dos principais sites que registram os projetos de software de código aberto e não-proprietário é o source forge. Um levantamento realizado nos primeiros dezenove dias de março de 2005 possibilitou constatar 99 mil e 107 projetos colaborativos, envolvendo 1.056.568 de desenvolvedores registrados. Em janeiro de 2004, o mesmo site registrava 75 mil projetos e um pouco mais de 780 mil pessoas envolvidas (TAURION, 2004: 77). O crescimento é contínuo e acelerado. Em abril de 2001 existia um pouco menos de 18 mil projetos e 145 mil programadores. Em outubro de 2002, passaram para 49 mil projetos e aproximadamente 500 mil programadores (GUROVITZ, 2002:19-20).
Nas principais áreas de fronteira tecnológica, ao contrário do que é divulgado pelos defensores do monopólio proprietário, a mobilização colaborativa é intensa. Existem atualmente somente no segmento de Clustering 378 projetos. Na área de desenvolvimento de computação distribuída existem 729 projetos (agosto de 2005). Com a inserção da indústria cinematográfica no mundo do código aberto, principalmente com o sucesso das produções da DreamWorks intensifica-se também os projetos de Games e entretenimento. Em agosto de 2005, podíamos contar no repositório do Source Forge 1075 projetos colaborativos de simuladores, 1893 projetos de jogos de estratégia em tempo real, 1009 projetos de MUD (Multi-User Dungeons), entre centenas de outros tipos de jogos.
Como defender que o navegador Mozila ou o Firefox desenvolvidos compartilhadamente não possuem qualidade? Que tipo de percepção enviesada é necessária para continuar afirmando que não podemos usar softwares livres por não serem sustentados por grandes empresas responsáveis pelos seus códigos? Como acreditar que somente o modelo de desenvolvimento proprietário é capaz de gerar inovações diante de tantas evidências observadas na prática tecnológica? Como é possível continuar afirmando que um software inseguro e instável que possui seu código-fonte fechado é melhor que um software aberto, estável e que pode ser completamente adequado as necessidades do mundo corporativo tal como o GNU/Linux?
Em geral, isto acontece por três fatores nada desprezíveis: o desconhecimento; as técnicas de aprisionamento do mundo proprietário e a estratégia de marketing dos monopólios de algoritmos. O primeiro fator é estritamente cultural e está sendo alterado gradativamente. O desconhecimento ocorre de vários modos. Existe a ignorância sobre a existência de um novo modelo. Muitas pessoas acreditavam que só era possível existir softwares proprietários, entre estes, alguns só conheciam produtos de uma única empresa. Outros não sabiam da existência de soluções livres e abertas para quase todas as áreas. Mas, certamente o desconhecimento mais difícil de lidar é daqueles que não querem conhecer, seja por desânimo ou por preconceito, em geral, ideológico. Alguns técnicos estão fora de sintonia com a chamada sociedade do conhecimento e acreditam não ser necessário aprender sempre. Esta postura baseada no desânimo militante é o principal aliado da manutenção do modelo proprietário.
As técnicas de aprisionamento também são essenciais para manter o modelo provisoriamente hegemônico de software. A indústria do software proprietário cria incompatilidades e artifícios exatemente para manter o seu cliente fidelizado ( na linguagem do marketing) ou aprisionado (na linguagem da Economia). Este modo de procededer é responsável por inúmeros gastos desnecessários de governos e empresas, mas ele é indispensável ao modelo proprietário. Se a interoperabilidade e a compatilidade fossem a regra, seria extremamente possível realizar migrações mais rápidas e menos complexas de um modelo para outro, de um conjunto de produtos para outro conjunto. O modelo proprietário é extremamente dispendioso e voltado mais para o benefício da empresa desenvolvedora do que para seus clientes-usuários. Esta é uma desvantagem que está cada vez mais sendo notada pelos usuários e já vem motivando a mudança para o modelo aberto.
Por que não ter o código-fonte dos sistemas e softwares que são utilizados por uma empresa ou órgão público? A quem beneficia o não-acesso a estes códigos? Qual a vantagem de não tê-los? Ao contrário, a posse dos fontes permite que novos desenvolvimentos sejam realizados com qualquer empresa e não somente com aquela que desenvolveu a primeira versão. O acesso ao código-fonte permite ao usuário a compatilidade dos novos sistemas com os anteriores e permite a redução de custos, além de maior segurança, uma vez que possui auditabilidade plena sobre o que está utilizando. Assim, para evitar as facilidades de escolha e de mudança aos usuários é que o modelo proprietário também nega acesso ao código-fonte. Um dos maiores fatores de aprisionamento dos usuários não-corporativos é a chamada “pirataria” que será tratada mais a frente.
A estratégia de marketing das mega-corporações de softwares e aplicativos básicos é outro elemento vital da redução do ritmo de implantação de software livre. Ela combina volumosas verbas publicitárias, doação de equipamentos e laboratórios para universidades carentes de recursos, contratos de exclusividade, pressão sobre empresas de hardware, FUD (Fear, Uncertainly and Doubt, ou seja, a técnica de espalhar o medo, a incerteza e a dúvida) e ação de lobbies, principalmente sobre o Estado. Entretanto, isto não consegue impedir o avanço do modelo colaborativo. Apenas, retarda a substituição do paradigma hegemônico de desenvolvimento e uso de software.
Uma comparação feita pela Revista Wired, em fevereiro de 2005, demonstra a existência de segmentos em que o desenvolvimento não-proprietário já é dominante. Os percentuais relacionam o produto à totalidade do mercado daquele segmento. Os primeiros produtos em cada segmento são propriedade da Microsoft, os segundos são os principais produtos não-proprietários: Browsers (IE 92%, Firefox 4%); Desktop (Windows 95%, Linux 3%); Application Servers (Windows 62%, Linux 19%); Databases (SQL Server 64%, MySQL 49%); Web servers (IIS 21%, Apache 68%); Mail Servers (Exchange 10%, Sendmail 41%); Email client (Outlook Express 19%, N/A); Web enciclopédias (Encarta Premium 68,000 entradas; Wikipedia 431,195 entradas).1
O movimento colaborativo está prestes a criar massa crítica junto aos usuários residenciais. Acontecendo isto, a tendência é sua velocidade de expansão acelerar. Em paralelo, o paradigma proprietário já emite sinais de saturação. Quando um paradigma técnico ou científico começa a esgotar-se ele tenta absorver elementos do paradigma concorrente para prolongar sua existência hegemônica. Isto não quer dizer que o modelo proprietário será extinto, isto significa que perderá força e será minoritário. Quando o monopólio de software proprietário passa a oferecer uma parte ou a totalidade do seu código-fonte para governos e grandes corporações, mesmo sem a possibilidade de compilação, mesmo com a exigência de um acordo de confidencialidade, isto é a maior demonstração de que o modelo de código fechado não pode ser considerado a priori seguro, como seus vendedores gostavam de falar. Abrir o código é elemento do novo paradigma, não do paradigma proprietário.
Para conter o crescente uso do software livre no segmento educacional e de inclusão digital, muito mais barato e estável, portanto, com custos de manutenção bem menores, o monopólio de software proprietário passa a entregar licenças gratuitas. Ora quem não cobra pela licença de uso do software é o modelo livre. Mas absorver elementos do novo paradigma é um dos sinais mais evidente de esgotamento do modelo de remuneração baseado no pagamento de licenças de propriedade. A maior empresa de software proprietário do mundo já diz trabalhar com o conceito de open source, hoje apenas para confundir, mas em breve por necessidade real.
A mobilização colaborativa em torno do código aberto cresce porque está de acordo com as possibilidades geradas por uma sociedade cada vez mais conectada e em rede. Esta percepção foi muito bem apontada pelo Professor Imre Simon: “A rede Internet está protagonizando um fenômeno novo, sem precedentes na história da nossa civilização, cujas consequências consideramos potencialmente imprevisíveis no momento. Estamos nos referindo à criação cooperativa de bens de informação por centenas, às vezes milhares de autores que se comunicam através da Internet. Mencionamos duas instâncias deste fenômeno, ambas quase inteiramente contida nos últimos dez anos: o advento do sistema operacional GNU/Linux e a construção do conteúdo coletivo da “world wide web”.
NEGAÇÃO DE ACESSO E MONOPÓLIO
A teoria econômica clássica aponta que os monopólios acabam reduzindo o ritmo das inovações, criando distorções de valor e ineficiências. Por isso, a concorrência é enaltecida. O mais interessante é constatar que apesar disso, a propriedade de idéias é baseada em monopólios temporários cedidos pelo Estado ao criador ou inventor. Quando surgiu a proteção legal à propriedade das idéias, esta visava o benefício social e a superação do segredo em relação a uma técnica. Por isso, em troca da socialização de um invento ou técnica, o Estado daria o direito de exploração exclusiva daquele invento ou técnica ao seu criador, por um determinado tempo. O objetivo era garantir o fluxo do conhecimento e não interrompê-lo. O objetivo era assegurar a incorporação das técnicas pela sociedade e não a constituição de uma economia de monopólios. O monopólio temporário de um invento era entendido como um mal necessário e um preço que se pagaria por sua socialização.
Isto não retira a constação da enorme existente na economia das idéias que tem sua remuneração alicerçada na garantia política, ou seja, estatal, da prática de monopólio. Em excesso, esta prática pode acabar perdendo suas qualidades e fazendo emergir suas distorções.
O software talvez seja o mais típico dos bens informacionais, a mais representativa criação da era da informação e um dos principais produtos da economia das idéias ou dos bens intangíveis. Exatamente por ser um bem imaterial, suas qualidades são completamente distintas dos bens materiais. A propriedade sobre uma idéia, uma informação, um algoritmo, um software, ou seja, sobre bens intangíveis é realizada pela negação do acesso. A propriedade de algo que não possui existência física é extremamente complexa.
Os bens intangíveis não possuem as duas características econômicas principais dos bens materiais: a escassez e o desgaste pelo uso. Um produto material para ser produzido em quantidade requer um conjunto de materiais que são finitos e, portanto, sofrem o fenômeno da escassez. Um software para ser reproduzido não exige nada além de uma mídia para a reprodução. Pode ser copiado em rede um vez ou um milhão de vezes. O número de cópias é irrelevante, exatamente por ser um bem imaterial inexiste escassez e desgaste em cada cópia. Além disso, o custo adicional de reprodução de uma cópia é igual a zero, ou é igual ao preço do suporte utilizado para a sua reprodução.
Richard Stallman, fundador do movimento pelo software livre, costuma afirmar que quando duas pessoas trocam maçãs, nada de especial acontece. Uma pessoa que dá sua maçã para a outra e recebe da outra uma maçã em troca, assim cada uma continua com uma única maçã. Isto não ocorre com bens imateriais. Caso duas pessoas troquem idéias, o fenômeno é completamente diferente. Se duas pessoas dão uma idéia, uma para a outra, elas ficam com duas idéias cada uma. Qual a diferença? Quando passo minha idéia ao outro não fico sem esta idéia, continuo com ela. Isto quer dizer que o bem imaterial pode ser clonado, copiado, reproduzido sem nenhuma perda ou desgaste do original.
Estas características é que tornam a propriedade sobre idéias, informações, bens informacionais em geral, completamente dependente da proteção política, ou seja, da lei e do aparato jurídico-repressivo do Estado. Por este motivo, existem somente algumas possibilidades de exercer propriedade sobre informações: a primeira é não as divulgando. A segunda é tentando realizar um controle de acesso. A terceira é pela ação do Estado que agiria contra aqueles que têm o acesso negado pelos criadores da informação. Nesse sentido, a principal forma de propriedade de bens informacionais e imaterias é exclusivamente política.
Apesar destas gigantescas qualidades dos bens informacionais, das idéias e do conhecimento (entendido como informações codificadas, organizadas e processadas), ou seja, não ser escassa, não se desgastar, não se perder quando copiada, em nossa história sócio-econômica isto passou a ser considerado o grande problema. Na verdade, é um grande problema para aplicar sobre estes bens imateriais o contrato de propriedade fundado no princípio das coisas escassaz, não-reprodutíveis a um custo igual a zero e com sua reprodução centrada na exigência de nova matéria-prima. Como resolver este problema? Com o monopólio da definição do acesso dado ao criador.
O problema é quando o monopólio que antes era temporário passa a ser centenário. As legislações estatais ao estenderem o direito de propriedade de um bem imaterial, uma idéia, um conjunto de algoritmos, por mais de 95 anos após a morte do criador estão invertendo a lógica inicial da proteção. Não é mais a sociedade que interessa. Não é mais a garantia do fluxo do conhecimento que importa, mas o que interessa é assegurar a lucratividade máxima para um agente econômico e negar o acesso ao bem protegido pelo maior tempo possível. O exagero passa a sobrepor o controle ao fluxo do conhecimento.
Para incentivar a inovação e a criação, os monopólios são péssimos. Com a expansão dos prazos de monopolização de conhecimento coloca-se em risco as possibilidades de criação e de compartilhamento dos inventos, das grandes sacadas, o que foi fundamental para o gigantesco progresso técnico-científico alcançado pela humanidade até meados do século XX.
No processo que o Departamento de Estado norte-americano moveu contra a Microsoft, os economistas Joseph Stiglitz e Jason Furman apresentaram uma declaração a partir de um estudo que lhes fora encomendado pela Computer & Communications Industry Association, no final de 2002. É importante notar que do ponto de vista da teoria econômica não existe consenso sobre os impactos do monopólio sobre a propriedade intelectual, como é possível notar na declaração a seguir:
"A indústria da tecnologia da informação é caracterizada pela rapidez das mudanças tecnológicas. Como a moderna teoria da competição e monopólios enfatiza, é importante focar não apenas aquilo que afeta o consumidor hoje, mas também como a mistura de monopólio, competição e regime de propriedade intelectual afeta o ritmo e a direção do processo de inovação.
Schumpeter acreditava que o receio de perda das rendas do monopólio levava os monopolistas a continuar inovando, usando os lucros para financiar as inovações. Entretanto, o ritmo com que as inovações são introduzidas poderia ser mais rápido se o poder dos monopólios fosse podado.
O monopólio diminui o passo das inovações de quatro maneiras.
Primeira, inovações precedentes são os principais insumos de inovações subseqüentes. O poder monopolista aumenta o custo de se buscar inovação. E quando se aumenta o custo de um insumo numa atividade, o nível desta atividade cai.
Segunda, com mais barreiras à entrada num negócio, a ameaça de competição schumpeteriana e, portanto, os incentivos para inovar diminuem. Num caso extremo, se um monopólio se assegurar de que não há ameaça de competição, ele não investirá em inovações.
Terceira, a própria inovação pode ser mal-direcionada afim de garantir o aumento tanto das barreiras de entrada quanto dos custos dos rivais. Em sistemas operacionais, o desenvolvimento de padrões proprietários alternativos e a construção de middleware não-interoperável são exemplos de inovações que podem potencialmente reforçar o poder monopolista.
Quarta, os incentivos de um monopólio para inovar são limitados. Como o monopolista produz menos que o socialmente ótimo, as economias com uma redução no custo de produção são menores do que num mercado competitivo. Também os incentivos para um monopolista patrocinar pesquisas não as levarão ao nível socialmente eficiente. Preferencialmente sua preocupação é inovar apenas no ritmo necessário para afastar a competição, um ritmo marcadamente menor que o socialmente ótimo.
Em resumo, monopolização não ameaça os consumidores apenas pelo aumento dos preços e pela redução da produção, mas também reduz a inovação no longo prazo." (STIGLITZ & JASON)
Todo o esforço teórico-doutrinário para defender o monopólio sobre a criação como fundamento do incentico à criação, além dos riscos apontados por Stiglitz e Jason, trata-se de uma argumentação econômica empiricamente fragilizada, pois desconsidera o que Prof. Yoshai Benkler denominou de "commons-based peer-production". Empiricamente constata-se a evolução constante da produção compartilhada de software e, agora com o movimento Creative Commons, também de músicas e outras criações culturais. Também é possível observar o modelo de desenvolvimento "bazar" (termo empregado por Eric Raymond para falar do desenvolvimento distribuído e anarquico do software aberto) que está sendo aplicado em inúmeros projetos internacionais de software, e atualmente envolve aproximadamente 150 mil programadores na construção e correção de cada nova versão do GNU/Linux. O que cada colaborador desta rede de desenvolvimento cede ao produto é bem menor do que o ganho que pode obter posteriormente com o uso deste programa colaborativo. Este processo também foi denominado de gift economy, ou economia da doação.
Benkler, no artigo Coase´s Penquin, or, Linux and The Nature of the Firm, publicado em 2002 no The Yale Law Journal, defendeu que a Internet está viabilizando a produção colaborativa entre pares (common-based peer-production), um conjunto de novas formas cooperativas de produção de informação, conhecimento e cultura em oposição aos mecanismos habituais de propriedade, hierarquia e mercados. Eles estariam baseados na troca e compartilhamento voluntário de trabalho:
“O papel das normas, o papel da tecnologia, e a interação entre voluntarismo e ganho econômico na formação da motivação e organização de uma produção colaborativa são também áreas de pesquisa importantes, particularmente o estudo de como as comunidades de colaboradores se aglutinam em torno de projetos. Estudos qualitativos e quantitativos da importância da produção colaborativa [peer production] na economia informacional geral, em particular na economia informacional baseada na Internet, forneceria uma melhor compreensão sobre quão periférico ou central é esse fenômeno. Para firmas, a emergência da produção colaborativa pode requerer um deslocamento mais agressivo, a partir de modelos negociais baseados em produtos informáticos, em direção a modelos negocias baseados em serviços.” (BENKLER, 2002: 77)
Projetos inovadores estão sendo realizados fora do modelo hegemônico de direitos de propriedade e têm gerado ganho economicamente distribuídos entre os desenvolvedores destes projetos que não se formaram a partir da exigência dos direitos exclusivos sobre a propriedade daquelas idéias. Esta constatação enfraquece profundamente o paradigma da exigência do monopólio econômico da exploração da obra ou invento como elemento essencial para a obtenção de ganho econômico e para incentivo à criatividade e à inovação.
PARA QUE NEGAR O ACESSO AO CÓDIGO-FONTE? PARA EVITAR A PIRATARIA?
Um dos principais argumentos utilizados para defender o modelo proprietário baseado no código-fonte fechado é que com a sua abertura os piratas roubariam os códigos. Trata-se de uma das miragens contemporâneas mais frequentes. Como toda miragem não resiste a realidade. O código-fonte fechado não tem como objetivo evitar a pirataria, mas impedir o livre fluxo do conhecimento com vistas a reduzir o ritmo da inovação que poderia ser feita sobre este código.
A pirataria de software é feita sobre o código executável e não sobre o código-fonte. Um dos softwares mais copiados ilegalmente é o Office. Seu código-fonte está fechado e nem por isso, a pirataria é barrada. O que se pretende com a opacidade dos fontes é evitar que outros possam desenvolver soluções melhores. Por isso, para retirar o máximo de proveito de uma determinada solução informacional é que se faz necessário o código fechado.
Aqui também é importante observar melhor o fenômeno da pirataria. Sem ela seria difícil estabalecer monopólios de algoritmos. O mecanismo é bem claro. O monopólio de software sabe que quanto mais usuários residenciais utilizarem seu software mais ele mantém uma massa crítica indispensável para a fidelização do mundo corporativo. Assim, o custo das licenças já prevê que o mercado pagante é o das empresas e instituições, públicas e privadas.
Nesse sentido, a pirataria é indispensável para a manutenção de uma grande massa crítica para o monopólio. O Estado é indispensável para obrigar o mundo corporativo a pagar pelas licenças de propriedade. Enquanto empresas pagam, o Estado faz vistas grossas para a pirataria residencial. Até por que se começasse a obter mandados judiciais para verificar os computadores residenciais, encontraria uma infinidade de softwares piratas. As pessoas teriam que ser punidas e isto fortaleceria o paradigma oposto, faria o movimento de software livre ganhar mais força.
O modelo de remuneração dos monopólios de software proprietário é insustentável e inviável para usuários residenciais. Basta comparar o preço das licenças de propriedade:2
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Algumas licenças de software bem populares tem o mesmo preço do computador. Um absurdo. É óbvio que a maioria das pessoas em suas casas não pagam por estas licenças, ao mesmo tempo, que esta prática é extremamente funcional a manutenção da hegemonia do paradigma proprietário. Por este motivo a pirataria de software não devia ser chamada de pirataria, mas de prática corsária. Corsários eran piratas a serviço de um poder. A pirataria beneficia os monopólios de software e algoritmo, portanto, na verdade os piratas são corsários digitais, pois servem a manutenção do poder monopolista. O movimento de software livre é alternativa efetiva a prática ilegal de uso não autorizado de licenças de propriedade.
O MODELO PROPRIETÁRIO É PREJUDICIAL AO ESTADO
Por que pagar dezenas vezes pelo mesmo trabalho? Por que não otimizar os gastos públicos? Por que não criar mais soluções novas do que pagar várias vezes pelas mesmas soluções já pagas? Um dos pincípios do Estado é o da economicidade. Por ele, o modelo de software livre seria adotado quase exclusivamente. As vantagens para o Estado com o uso do software livre são bem superiores as que podem ser obtidas com o modelo proprietário de aquisição.
Quando se adquire um software livre, o Estado tem o código-fonte desse software documentado e uma licença permissiva de uso, contendo 4 liberdades: a liberdade de usar o software para qualquer fim, de estudá-lo sem restrições, de alterá-lo e de redistribuir suas alterações. Com isto, ao invés de comprar inúmeras vezes licenças de propriedade, o Estado economiza e compra uma única vez o desenvolvimento do software. Por ser dono do que comprou e pagou, o Estado tem maior autonomia no modelo de software livre.
Ao possuir o código-fonte daquilo que utiliza, o Estado adquire também maior independência diante dos fornecedores. Novos desenvolvimentos e a inclusão de novas funcionalidades no software podem ser realizadas sem incompatibilidades, além de permitir que sempre se possa escolher a melhor empresa desenvolvedora para fazer tais alterações, sem estar aprisionado ao primeiro desenvolvedor.
No modelo proprietário, o Estado nunca é dono do que pagou. O dono sempre será a empresa que detém o código-fonte e a titulariedade do licenciamento proprietário. Trata-se de um modelo ruim e caro para o setor público. Visando confundir para continuar sua exploração econômica, o monopólio de software proprietário quer confundir os gestores públicos ao afirmar que no modelo proprietário está se pagando pelo suporte. Este argumento é equivocado, pois do contrário os Ministérios não teriam que contratar as empresas de informática para dar suporte as soluções proprietárias que implantou. Não haveria necessidade de contratos gigantescos com empresas tercerizadas que ultrapassam hoje o faturamento do Serpro.
Utilizando o modelo de software livre, por exemplo o Estado poderia desenvolver um único GED (sistema de Gestão Eletrônica de Documentos) para todos os seus Ministérios ao invés de desperdiçar mais de R$ 1,5 milhão em cada licença de propriedade para cada uma de suas unidades. Além de assegurar a interoperabilidade e compatibilidade para que tudo se comunique com tudo, as melhorias indispensáveis a cada período poderiam ser realizadas com um custo bem menor, pois inexiste aprisionamentos, opacidade de códigos e descontinuidades, o que permite escolher sempre o melhor e o mais barato desenvolvimento.
No modelo de desenvolvimento e uso de software livre, as soluções podem ter seu código-fonte publicado e devolvido à sociedade. Ao abrir os códigos daquilo que usa o Estado permite que seja criada uma rede de colaboradores para a melhoria e amnutenção dos programas. O modelo do software livre incentiva a colaboração, reduz custos e assegura que os recursos do Estado sejam direcionados para a criação constante de novas soluções e não para remunerar licenças de propriedade.
Walter Bender, diretor do MIT Media Lab ( Laboratório de Mídia do Instituto de Tecnologia de Massachusets) e David Cavallo, também pesquisador do Media Lab, ao responder uma consulta feita pelo ITI sobre o uso de software livre nos programas do governo brasileiro concluíram: "Existe um grande potencial de aprendizagem no uso do software livre que não existe no software proprietário. Se o código fonte é proprietário, é oculto da população em geral. Este fato tira desta população uma grande oportunidade de aprendizado . Quando o código fonte é aberto e existe uma comunidade que aceita contribuições de melhorias ao ambiente ou de novos aplicativos, então tudo isto também é aberto ao mundo, ou, pelo menos, ao mundo com acesso. Não apenas o código fonte serve como exemplo de idéias e implementações de programação, mas a comunidade de desenvolvimento serve como uma comunidade de prática social com o acesso de todos. Isto representa uma base global gratuita de suporte e educação."
BIBLIOGRAFIA
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Disponível no site: http://www.cic.unb.br/docentes/pedro/trabs/ssi2001.htm. Acesso em 10 dez 2004.
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TAURION, Cezar. (2004) Software livre: potencialidades e modelos de negócios. Rio de Janeiro: Brasport.
3 comments:
Particularmente acredito que muito do que é falado aqui é besteira! afinal qual o valor de uma idéia ou invenção? não é direito de quêm teve a idéia ou criador de ter lucro? afinal fora o tempo gasto que é mensurável, como dar valor a uma idéia? é rediculo... o criador têm o direito de vender, alugar ou dar! compete a ele e a apenas ele (democracia) e não obrigar a um código aberto (mais parece um velho blá blá blá de marxistas), posso afirmar que a ciência desde os primordios foi paga... basta ler um pouco de história! e em geral bem paga! por quê? é apenas questão de bom senso e tentar visualizar quantos indivíduos possuem idéias inivadoras ou inventivas em um universo de milhões! fora isto o conceito de monopólio está sendo mau empregado! já que me geral existe mais de uma forma de fazer a mesma coisa! se conseguir... fizer... já é uma concorrência! isto de monopólio não se aplica à ciência e muito menos à computação, onde vários sistemas com linhas de código diferentes, com linguagem igual ou diferente fazem a mesma coisa! a Microsoft que o diga (campeã em copiar idéias)! terminando... a idéia inicial de software livre já morreu ou está morrendo! já que se por um lado não se compra, por outro se paga pela manutenção, seja esta por demanda ou contrato mensal! poucos são os sistemas Open source que realmente dão certo e muitas empresas têm dificuldades em treinar seu funcionários para usálos, por falta de suporte, onde entram terceiros que cobram pelo serviço! do universo de sistemas existentes... quantos estão ativos? quantos foram abandonados? O maior problema do Linux é que existem tantos... e incompatíves! já que sempre existe um onde aquele programa dá erro!
por isso uns preferem FreeBSD... ou um OpenSolaris, mas se quiserem um bom suporte... vão de AIX, Solaris e etc...
Terminando... a ciência nunca divulgou todo seu conhecimento! todos guardam algo para si mesmos!
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